segunda-feira, abril 02, 2007

 
Orgulho Gay

Outro dia, eu passei os olhos por um texto de um rapaz muito exaltado com o foco que se tem dado à cultura gay, onde ele questionava o por quê da bobagem de haver um dia para o orgulho gay. Não tendo um dia do orgulho hétero, o que teriam os gays por se orgulharem, ou merecerem isso?

Então pus-me a pensar na deferência e ocorreu-me uma rápida lista de datas especiais que comemoram, no fim, coisas semelhantes, quanto mais não sejam, pelo que representam, como: Dia internacional da Mulher; dia internacional da criança; dia do Índio; comemoração da abolição da escravatura…

O sexo feminino representa praticamente a metade da população mundial, representando assim também, uma enorme fatia do grupo heterossexual, mas com o dia 8 de Março reservado. Logo, a queixa dele seria, talvez, não existir um dia de orgulho heterossexual masculino. Mas vejamos: O dia da mulher lembra-nos da sua igualdade, da sua importância, da sua identidade e isso só ocorre, exatamente por todos estes predicados terem sido ignorados ou desrespeitados ao longo dos séculos. As mesmas razões se atribuem para qualquer celebração de uma minoria.

Depois pensei se teria algo a ver com a festa em si. Sim, por talvez alguns homens sintam sua masculinidade, ou a idéia que têm dela, ameaçada por tanta lantejoula e sungas justas, somado a uma total desinibição em rebolar. Mas por fim, ao imaginar como seria a festa do orgulho heterossexual masculino, veio-me a mente um local com telões exibindo jogos de futebol, homens encharcados em cerveja, que não sabem conversar um com outro sem ficar beliscando o ‘pinto’ e um terrível odor a metano no ar! De facto um cenário que não se tem muito orgulho.

Mas falando sério, o dia do orgulho, caracterizado como está, é para chamar a atenção, lembrar que apesar de minoria, são pessoas activas, eleitores, contribuintes, pais, mães e irmãos de alguém que injustamente, têm suas vidas podadas pela ditadura do ser humano comum.

De todas as características que compõe a nossa raça, não vejo pior do que a ignorância que assola o ser comum, infelizmente, a maioria. O que nós hoje sabemos que foi peste bubônica, causada pela infestação de ratos, na Idade Média foi vista como ‘peste negra’, como uma punição divina pelos pecados que cometiam. Ainda sim, na década de 80, a AIDS, logo que surgiu, foi chamada de câncer gay e dizia-se também ser uma punição a pecados, caindo num conveniente e silencioso esquecimento, quando se revelou que o maior grupo de risco, afinal, era/é os dos heterossexuais.

As mulheres tiveram direito ao voto pela primeira vez em 1893 na Nova Zelândia. Contudo, na década de 60 do século passado, elas ainda queimavam soutiens em praça pública exigindo igualdade de direitos. Responsáveis pela criação e aceitação de seus filhos, ‘elas’ não conseguem deixar de se conduzir por velhos e falidos ‘conceitos’, desprezando e rejeitando parte fundamental da essência de seus herdeiros.

Por isso tem o dia do orgulho. Para lembrar e avisar as pessoas presas, comuns, que as civilizações evoluíram, que a ciência se desenvolveu e que não estamos mais, já algum tempo, de tangas, em volta de fogueiras, fazendo farinha de raízes e caçando felinos pelas matas para comer! O ser comum precisa, sistematicamente, ser lembrado, ser chamado a uma espécie de reality check, de forma a ser confrontado com o seu tempo presente e deixar o passado no lugar dele.

O orgulho é o da consciência, de se estar vivo, de se aceitar quem se é, como se é, de se fazer frente a uma maioria, num gesto muito maior e significativo e por que não, colorido, festivo e de bom gosto.

Uma boa semana para todos.

Eduardo Divério.

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