segunda-feira, novembro 14, 2011
Catedral de Gelo
Todo mundo, que me conhece, sabe que sou fanzão de filmes de horror e terror. Ultimamente, devido a carência da qualidade deste género na indústria cinematográfica, tenho me virado para algo, a principio, nada relacionado mas que tem cumprido a função muito bem: Planeta Earth, um documentário sobre a vida no planeta Terra e suas migrações.
Na última semana, na cobertura dos círculos polares Árticos e Antárticos, falou-se dos pinguins. Esta incrível e organizada comunidade, encontra-se na Antártica pelo início da Primavera local e depois de alguns pequenos jogos de acasalamento, eles formam pares. A senhora pinguim então, com o anúncio do Inverno, e com suas reservas alimentares já reduzidas, devido a energia gasta em manter o ovo do casal aquecido, deve sair à procura de comida e para tal, ela transfere a tarefa parental para o senhor pinguim que passa a chocar o ovo.
As fêmeas todas deixam a comunidade juntas. Coisa mais querida, companheiras, ali, rumo ao horizonte. Eles, à medida que a guasca começa a fustigá-los, agrupam-se um ao lado do outro em muitos círculos, mas numa autêntica coreografia de revezamento, de forma que os mais expostos tenham chance de se aquecer e manter seus ovos aquecidos também.
Pelo fim do Inverno, os filhotes nascem e seus pais dão-lhe o último pedaço de alimento guardado para eles dentro de suas cavidades bucais. Poucas semanas depois as fêmeas retornam, juntas! Os machos lançam ondas de vivas ao vislumbrá-las de longe, é emocionante! E sabem do que mais? Os casais se reconhecem e as mães pões seus olhos em seus bebes pela primeira vez.
Isso tudo é muito fascinante, inacreditável quando pensamos que pinguins não sabem aritmética ou conduzir um carro ou mesmo que não são capazes de conversar a relação! ‘Poxa! Você sai assim, mundo à fora e nem uma carta! Eu aqui, a cuidar do nosso filho e você…’
Contudo, estou certo que todos viram Happy Feet. Mas o que o filme não revela é a parte trágica, um autêntico pavor, bastante comum, por entre estes eventos.
Muitas das fêmeas, por razões diversas, não regressam de suas jornadas, condenando à fome seus filhotes e seus parceiros. Algumas regressam para descobrir que durante aquele ballet todo para se manterem em círculos de aquecimento, seus parceiros descuidara-se do ovo e este congelara virando uma pedra de gelo. Os filhotes das fêmeas que eventualmente não regressaram, tentam desesperadamente conquistar o afecto de alguma outra pinguim que lhe possa alimentar. Alguns grupos de filhotes, perdem-se do grupo devido a repentinas mudanças climáticas onde a visibilidade, som e cheiro é zero, sucumbindo de frio. E ainda, existe um grupo de mães pinguins que enlouquecem com a perda de seus filhotes e que disputam entre si a posse daqueles que são ou ficaram órfãos, acidentalmente causando-lhes morte durante o processo devido a anarquia que se insatura!
É difícil olhar para a má sorte de alguns elementos desta sociedade, onde não se conduz carros ou resolvem problemas aritméticos e sequer têm acesso à cartomancia, ou podem ir a igreja acender uma vela em oração, e não se sensibilizar com tão pavoroso destino. Na verdade é-me impossível pensar em destino.
Ao ver este documentário eu apercebi-me de algumas coisas: Que só gosto mesmo de filmes de terror e horror quando sei que são ficção. Apercebi-me que histórias reais desta natureza angustiam-me profundamente a alma.
Também, postulo a idéia que não existe um Deus pinguim, com um plano para cada ovo gerado e que, afinal, ‘merdas’ acontecem sem causa ou merecimento. Que viver pode ser assim, duro, inóspito e cheio de riscos, mas que com força, metas, esperança, amor e parceria, atravessamos muitos Invernos, mesmo que estejamos à deriva das forças elementares, mesmo que não se saiba rezar e que se viva num grande deserto branco de gelo.
Uma boa semana para todos.
Eduardo Divério.