sexta-feira, agosto 03, 2012

 

Como você está?



Eu acredito que esta pergunta simples, de apenas três palavras, é umas das perguntas mais desgraçadas de se responder.  Acho  que num relacionamento contínuo, assíduo, ela surge claramente como pedido de atualização e sabemos exatamente o que dizer, como dizer e porquê dizê-lo.

Mas quando não conversamos com alguém há meses e uma avalanche de acontecimentos deslizaram por este entremeio, o que se responde? Ou melhor, como se responde?

Esta simples pergunta  porta o poder da generalidade e de onde vem, ou de quem vem, por vezes, ainda pode ser ‘traiçoeira’. Um ‘Como você está?’, ao final de um período de silêncio, pode denotar ressalva, apenas falta de tempo para escrever uma pergunta mais elaborada, excesso de confiança, interesse forçado, desinteresse, constrangimento, cinismo, apenas bater o ponto ‘trimestral’ e também, vá lá, ponha-me à par de sua vida.

Mas o quão profundo, verdadeiro, honesto, natural, confiante, analítico, sucinto ou genérico podemos ser?

Note que cada relação, entre duas pessoas, tem o seu historial, tem a sua medida emocional, tem os seus assuntos fechados, resolvidos ou não, tem os seus assuntos em aberto, tem os seus limites, tem mágoas e por isso questiono-me: O que estará criptografado entre estas três palavras? Qual o motivo da pergunta? Aliás, como se responde a um motivo desconhecido ou dúbio?

Bem, há tempos já, em termos de trato, eu reconheço-me como a minha própria referência. Com isso quero dizer que não me posiciono assim ou assado por precedentes. Sigo uma ‘cartilha’, a qual acredito que reflete os valores que sustento e as qualidades que prezo. Assim, talvez, diria que:

Uma boa introdução do indagador pode facilmente dar o tom da troca de correspondência;
‘Olá Eduardo. Faz tempo que não falamos, mas têm sido dias difíceis, pois o cachorro estava doente e o periquito fugiu. Isso deixou-me um bocado desanimado, desmotivado, mas lá pelas tantas, damos a volta por cima e retomamos nossa vida. No trabalho está tudo bem e com a bicicleta também. Mas enfim, como você está? Um forte abraço. Valdeci’.

Note que o indivíduo teve o cuidado de dar uma breve explicação ao seu ‘sumiço’ e ao narrar o que tem se passado com ele, claramente, dá o tom, a ideia ao quê se responder, como e porquê.

Mas é um fato que a escrita, apesar de ser a invenção que deu origem à história e mudou o mundo, não é algo corriqueiro da pessoa comum. Não só, eu diria mais: Escrever exige um sútil foco a nós mesmos que nem todos têm condições de dar. É um espelho, uma máquina do tempo virtual que nos faz reviver, rever coisas que talvez precisemos que fiquem esquecidas, ao menos por um tempo.

Escrever é revelar, é irrefutavelmente atestar uma intenção, um juízo e, nos dias de hoje, esconder-se atrás da imensidão genérica do apenas ‘como você vai?’ sugere-me segurança, mas não aquela segurança do tipo seguro de automóvel, que andamos lindos por aí, tirando ‘fininho’ das balizas de entrada de estacionamento de shopping centre, pois em qualquer caso, o seguro paga. Refiro-me aquela segurança de se entrar em casa e trancar a porta com três tipos diferentes e especiais de fechaduras, com grades nas janelas, onde o mundo fica do lado de fora.

Infelizmente, ter ‘chá’ não serve à todos, mesmo quando de certo, tem e é para todos.

Por isso meu amigo, minha amiga, você, se um dia apenas me perguntar ‘Como você vai?’ e receber apenas um ‘Eu vou bem, obrigado. E você?’ encare apenas como uma resposta à altura, e poder, da pergunta. Contudo, de antemão faculto que, criptografado na minha resposta está: ‘Mas o quê mesmo você quer saber e por quê?’.

Uma boa semana à todos.

Eduardo Divério. 

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