domingo, março 17, 2013
‘Tu vai querer ficar com os bilhete, ou não?’
Tão logo eu
ter escrito o título, o Word
sublinhou em verde as palavras: ‘os bilhete’, avisando-me que elas estão em discordância
gramatical. Contudo, sugestão nenhuma fez sobre a má conjugação do verbo ‘ir’
que, escrito na terceira pessoa, está associado também de forma incorreta ao pronome
da segunda pessoa.
Mas se nem
mesmo o Word foi capaz de identificar este erro, teria mesmo alguma relevância,
ou sequer seria justo, fazermos alguma crítica ao povo Brasileiro que parece também
não se importar com tais discordâncias? Vou mais longe; será mesmo o povo Brasileiro
o responsável presente nas origens deste fenómeno?
Se o Brasil
de D. Pedro II era uma terra industrializada, com grupos de pessoas bem
formadas e até com uma boa fama internacional na época, onde foi que o Português,
como língua, começou a se corromper?
Mais de
vinte e um anos de convívio com a estável língua Portuguesa Lusitana, que
afinal em termos de regras gramaticais e conjugações verbais é praticamente a
mesma que estudei ao longo das décadas de setenta e oitenta, deixaram-me com o
ouvido sensível. Porém, basta que eu me reúna novamente com meus patrícios, para
que o plural passe a ser empregue apenas sobre o artigo, mantendo o substantivo
no singular e para que usemos o pronome da segunda pessoa com um verbo conjugado
na terceira. Que raiz será essa?
Olhando
para trás, durante a estrutura social colonialista do Brasil, o ‘vós mecê’, muito
usado, começou a contrair-se para o ‘você’, que até hoje se conjuga com o verbo
na terceira pessoa.
Entretanto,
a linha imaginária do Tratado de Tordesilhas que dividia as terras do ‘Novo
Mundo’ entre a coroa Espanhola e Portuguesa, já havia sido alterada por outros
acordos e já incorporava a atual zona Sul ao País que mesmo a falar o Português
da corte, ainda mantinha fortes traços gramaticais dos nostros hermanos, nomeadamente o ‘tu’ e o emprego dos clíticos.
Também, o
início do século passado no Brasil, é marcado pela imigração de mais 28 milhões
de Italianos que partiram para lá, atrás de uma vida melhor, de condições de
vida mais adequadas àquelas que conheciam na Europa. Mas isso, num ponto bastante
sensível da história, onde a mão de obra escrava estava a ser substituída por trabalho
pago e então, verdadeiras colónias de imigrantes Europeus formaram-se do
Sudeste ao Sul do país.
Por estar
altura então, excluindo os imigrantes Europeus (Alemães, Italianos, Espanhóis...),
40% da população era de ascendência Africana e com uma educação deveras limitada,
devido à escravatura.
A partir
deste ponto, surge um movimento silencioso e nada intencional, onde tínhamos
cidadãos Afro-brasileiros, Italianos, Alemães e Espanhóis tentando aprender
Português de forma a conseguirem emprego e adaptarem-se o máximo possível à
nova cultura.
Apesar de analfabetos, a população Afro-brasileira,
em relação à língua, tinha apenas a vantagem de conhecer sua fonética, pois que
de resto, todos viviam muito confusos com a estranha divisão de como as regiões
tratavam uma segunda pessoa, pois culturalmente, o ‘você’ não se referia mais a
um terceiro indivíduo e sim, a quem se dirigia o discurso, enquanto que a zona
Sul mantinha o ‘tu’, por força de origens.
Não só; também é de se referir que no Italiano, o
plural das palavras não segue a simples regra da adição da letra ‘s’. Por
exemplo: ‘menino’ é ‘bambino’ mas ‘meninos’ é ‘bambini’,
e aqui sugere-me uma compreensível corrupção
na formação do plural quando eles tentavam falar em Português, somado a
dificuldade de empregar a conjugação correta no verbo de discurso direcionado a
uma segunda pessoa de possível pronome variado.
Quando
ainda hoje existem colónias no Sul do país onde ainda se fala o Italiano e o
Alemão, torna-se fácil, para mim, perceber a tal ‘raiz’ de tamanha conivência
com tanta discordância. O Brasil é um país formado sem a evolução natural de
uma língua própria, que sempre ao defender suas divisas, acabou por conquistar mais
território de língua adversa. Tem sido
um país de presença multicultural no seu desenvolvimento, onde as pessoas
acostumaram-se a ouvir um Português corrompido, e sempre complementado.
Claro que a
combinação dos longos anos de regime ditatoriais por toda a América Latina mais
as grandes explosões demográficas, apenas fizeram por acentuar uma realidade
que, apesar de claramente desgovernada, era apenas um resultado sociocultural.
E assim, com
as ‘mão limpa’ e a alma lavada, espero que tu ‘consiga’ encontrar algo de
interessante nas minhas 'observação’.
Uma boa
semana para todos.
Eduardo
Divério.