segunda-feira, outubro 09, 2006

 
O Sexo e a Cidade

Amsterdam talvez seja a cidade mundial que vive um relação com o sexo de uma forma tão aberta, que este já se institucionalizou ao seu predicado. Quando andamos pela grande área central da cidade, a mais antiga e turística na verdade, deparamo-nos com sex shops, museu do sexo, cinemas, peep shows e mulheres em vitrines, vestidas com langerie e prontas a se prostituírem.

Contudo, Amsterdam, socialmente falando, é uma “cidade-país”, quero dizer, o resto da Holanda não a vê como sua “filha” mais querida e está povoada de emigrantes. Pessoas que não mais se chocam quando esbarram num pénis de borracha ou em mulheres semi-nuas a se venderem. Na verdade, não lhes fazem mais a menor diferença.

É exatamente isso o que acontece com qualquer processo de repetição, de normalização. Quanto mais exercitamos algo, menos misterioso isso se parece, mais confiante ficamos e eventualmente, dominamos a situação de uma tal forma, que ela se banaliza para nós.

Com isso eu quero dizer que tudo o que se repete, e absorvemos como prática, ganha novo significado, talvez novo conceito e indiscutivelmente, amplia nossos horizontes, nossos limites. Mas o que pode acarretar, dentro de uma relação “sexo e cidade”, este ampliar de limites? Uma injusta confusão e uma possível marginalização do indivíduo, eu diria.

Todos nós lembramos de nosso amadurecimento sexual, certo? O quanto custou a se dar o primeiro beijo, a chegar “lá” com uma mão, ou permitir que em nós “lá” chegassem com ela. Neste preciso ponto, ainda não tínhamos, talvez, a noção que barreiras maiores estariam muito próximas de se rompidas: A descoberta das sensações com a língua...

Muitos de nós, a partir daí, atingiram níveis diferentes e ampliaram seus limites com mais ou menos extensão. Então eu pergunto: O que distingue, define, o quão longe nossos limites podem ser ampliados?

Lá pelo quarto ou quinto ano da década de oitenta, lembro-me dos programas dedicados às mulheres. Muitas vezes o assunto era sexo e sexualidade, mas claro, de uma forma muito didática. Foi quando se começou a ouvir que era saudável uma mulher poder se masturbar, que não tinha nada de errado e que procurar seu próprio prazer era algo positivo. Em outras palavras, era um aval para que centenas de mulheres se libertassem do medo de serem apontadas na rua como desavergonhadas, ou queimarem no inferno.

Mas então, será isso, o que fazemos só entre quatro paredes, sem o aval da sociedade, um pecado ou simplesmente, algo “errado”? Uma degradação da pessoa? Bem, eu não sei as coisas que você só faz entre quatro paredes, mas aposto que são muito boas e que lhe garante memoráveis orgasmos. Mas então por que algo tão bom para nós deve ser mantido em segredo, do meio a volta e muitas vezes da própria pessoa que dorme conosco?

Aqui nasce o vício, a escravidão e a subserviência enquanto membro social. Uma vez tanto prazer exigir a certeza que a porta está trancada e as cortinas corridas, estamos postulando estar fazendo algo de errado, ou não correto e vergonhoso e estes momentos, tornam-se nosso refúgio, nosso limbo de descanso onde temos o controle e o prazer total.

Porém, como tudo que é proibido mas exercitável, cresce sem agentes moderadores - postulando que estes sejam de alguma forma positivos a nossa pessoa – daí, o céu é o limite. Ora, o que eu faço já está “errado” desde o começo e por isso me escondo, logo ninguém sabe. Se ninguém sabe o que faço, estou livre de julgamentos e pressões, e prazer, nunca é demais.

O prazer nada mais é do que uma maravilhosa reação química descarregada na corrente sanguínea e passada por nossos neuro-transmissores. Dopamina e endorfina que circulam num tráfego livre e ilimitado de sensações, dados pela natureza.

O simples fato de uma pessoa se reprimir, se esconder, suprimir seu lado social por desajuste é, para mim, um mal terrível e irreparável na estima da mesma. Ela subverte-se e assume ser uma “maçã podre” no cesto e como se tivesse duas vidas, no trabalho ela fala sobre assuntos filantrópicos e em casa, perde-se por entre suas fantasias e o seu prazer. Não que as pessoas precisem falar da sua intimidade, mas o que me incomoda é elas não “poderem” fazê-lo, não só, negarem-no se a espontaneidade surgir.

Consigo ver a idéia da coisa: O sexo, via de regra, é uma coisa íntima, bonita de se viver a dois, para se fazer com amor. (Lembrei-me do texto “Bodas de Açúcar”). Então, obviamente que se você passa a explorar suas sensações de prazer pelo sexo, você está corrompendo um conceito, degenerando uma idéia e subvertendo uma moral.

Mas ninguém pára para pensar o que provoca esta procura, este comportamento e o pior é que as pessoas que se esgueiram pelas madrugadas e trancam-se à chave em seus quartos, são as mesmas que apontam para os outros, reprimindo-as de seus atos.

A cidade está repleta de recantos e esconderijos e seus filhos, uns mais lícitos do que outros, circulam pelas ruas fazendo ar de “cidadãos decentes”, desapercebidos do vício em que vivem, o de atuarem de “ cidadãos decentes” (o que quer que isso signifique).

Não desejo que as pessoas saiam por aí descrevendo suas acrobacias sexuais, mas desejo sim, que elas sintam-se em paz com elas mesmas, sem se sentirem julgadas e pressionadas e principalmente, a partir daí, mais seguras e capazes de entender as pessoas do lado, sem reprimi-las. Isso, seria um novo ciclo e ao exercitá-lo, ao criar um processo de repetição, viria daí então uma normalização, uma nova forma de se estar.

Desejo a todos uma boa semana (com muito prazer).

Eduardo Divério.

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