quarta-feira, outubro 17, 2007

 
Relação Aberta

Falar de relação aberta é quase o mesmo que falar de terapia psicológica, ou seja, só quem passou pelo processo consegue entender, saber não só o que é, mas como é. É uma ‘rotina’ nem tão incomum como se pensa, mas é um fato que também seu exercício não é muito bem sucedido. Mas afinal, o que envolve e constitui uma relação aberta?

Uma relação aberta consiste em se estar vivendo um relacionamento com uma segunda pessoa, um namoro ou um casamento, sem ter o compromisso da fidelidade. Claro que, como qualquer coisa que envolva o emocional humano, os níveis de tolerância em relação à frequência deste ‘não compromisso’ podem ser mais ou menos, ou mais, rígidos.

Eu, particularmente, acho que existe por aí uma grande confusão sobre este assunto e um mar de ‘casais’ justificando a sua infeliz e inconsciente existência, disfarçando suas dificuldades e amenizando seus fracassos enquanto ente responsável por 50% de um relacionamento.

Uma relação antes de poder ser aberta, como diz o próprio nome, deve ser uma relação, ou seja, interação entre pessoas. É obvio que o ‘aberta’ se refere a uma liberdade de carater sexual, logo, o termo Relação Aberta só pode ser aplicável a duas pessoas que se relacionem com sexo. E esta minha afirmação, estou certo, deve estar suscitando mentes a processarem um: ‘Não é bem assim…’.

Pois este é exatamente o ponto. Eu parti do conceito que um relacionamento amoroso entre duas pessoas deve ter sexo. Sabe-se que existem pessoas que estão juntas por imenso tempo, estiveram enamoradas no passado, continuam a ter uma conta bancária em conjunto, dormem juntas e programam tudo a dois sem se tocarem sexualmente. Não quero aqui ‘atacar’ o modo de vida de ninguém, ou a forma de equilíbrio que encontraram para suas vidas, mas isso para mim caracteriza uma relação de amizade, com um forte amor, mas amizade. Logo se existe sexo fora desta relação, para mim, não constitui uma relação aberta.

Isso introduz-me ao ponto onde entendo que, tudo, como qualquer processo da vida na verdade, vai sempre ser julgado a partir dos nossos conceitos. Com isso quero dizer que viver uma relação aberta, vai depender inteiramente do sucesso da boa definição entre os inúmeros conceitos que interligam o como sentimos e o como relacionamo-nos com alguém. Basta uma idéia incoerente, um pensamento que não se alinhe nesta teia e, para mim, a tal relação aberta acabou de arruinar a união de um casal.

Outra coisa: Relação aberta e bigamia (ainda que não oficial) não são ‘conceitos sinônimos’. Isto é, viver uma relação aberta não é ter um segundo relacionamento, não é se relacionar com uma terceira pessoa e sim, apenas ter a liberdade de ter sexo com esta terceira pessoa. E aí começam as confusões de conceitos.

Da forma como as pessoas olham para o sexo, este é associado a uma intimidade que só se pode ter alcance depois de se conhecer a segunda pessoa. Logo que, para conhecer alguém, querendo ou não, estamos nos relacionando com este ser, trocando impressões e aí, as emoções já correm soltas. Se temos um compromisso emocional com alguém, a quem nos dedicamos, qual é o sentido deste jogo, o falso interesse em conhecer alguém? Ter sexo?

A relação aberta só é possível sobre muito compromisso, sobre muitas certezas e discernimento. Numa relação aberta, não se procura sexo fora por compensação ou para se ter algo melhor. É meramente diversão, individualidade. A relação aberta para ser honesta, deve ter o mesmo sentido àquele quando estamos trancados em algum lugar nos masturbando, só claro, com melhores sensações… Quando nos masturbamos, via de regra, não existem sentimentos por ninguém e sim, apenas uma resposta a um estímulo, uma busca por prazer, tesão e alívio.

Viver uma relação aberta exige a confiança em sabermos que a segunda pessoa sempre voltará para casa sem números de telefones novos e sem marcação de segundos encontros, pois isso constituiria um ‘caso’, um relacionamento com uma terceira pessoa. Exige, ainda, confiança também de nosso próprio auto conhecimento, em não confundirmos uma foda altamente compatível e gostosa, com o amor de nossas vidas e aqui, de novo, acho que o povo em geral se perde… Feio.

As pessoas vivem tão desavisadas de como funcionam, do que são ou do que sentem falta ou ainda, do que procuram, que se confundem entre ‘cores e odores’. Uma relação passa por altos e baixos e é preciso um senso de justiça e equilíbrio bem exercitado para ultrapassá-los. Olho para trás e penso que se em todos os momentos em que me apeteceu ‘chutar o pau da barraca’, se o tivesse feito, jamais teria vivido tudo o que de maravilhoso veio nos anos a seguir a este momento, depois de ultrapassado a crise. E isso fortalece-nos, isso faz-nos confiar na segunda pessoa e fazer-nos não querer, não precisar procurar nada fora, senão, uma boa ‘escabelada no palhaço’, porém, acompanhada.

Mas acima de tudo, para mim, ao pensar no assunto, é importante entender que a relação aberta não é a saída, ou a receita para isso ou aquilo. Como tantas outras coisas na vida, esta rotina requer pré-disposições, inatas ou desenvolvidas, e serve apenas para um grupo. Não deve ser vista como uma ameaça à alguma instituição, ou ainda, como algo de caráter patológico.

Uma relação aberta, honesta, talvez, seja a consequência de um outro nível de valores, de uma outra forma de se ver o ser humano e de se amar, no sentido de parceria, um outro ser humano.

É não ter a pretensão de querer comandar o universo inconsciente de alguém, o ente biológico, químico e individual que é a outra pessoa. É aceitar que o compromisso da segunda pessoa para com a primeira, em construir um futuro a dois, é o bastante. É aceitar e sentir-se grato pela segunda pessoa estar a gerenciar seu espaço individual para coabitar com a primeira, fazer planos com ela, cobrir-lhe a noite, fazer-lhe uma refeição, planear uma viagem surpresa, controlar-lhe o horário para algum remédio, perguntar-lhe como foi o dia, acordar-lhe pela manhã para fazer amor, enxugar-lhe lágrimas, alegrar-lhe quando preciso ou só amar-lhe.

Tudo isso, claro, com a maravilhosa consciência que aos olhos da outra pessoa, a segunda referência, deste texto, será sempre você.

Uma boa semana para todos.

Eduardo Divério

Comments:
Concordo em parte com a definição de relacionamento aberto, em si centralizarei minha idéia na conotação sexual empregada no texto do que no relacionamento aberto. Seria ingenuidade considerar que nossa sociedade ocidental, de ideologia cristã, atribui ao sexo o sentido da fidelidade meramente por razões morais. Até mesmo nas tradições pré-cristãs o sexo era considerado sagrado, quando os seres humanos conseguem atingir um estado de amor incondicional muito além do prazer instintivo. Bem verdade que muitas vezes não se tratava de uma prática sexual monogâmica, mas ainda assim longe de ser meramente instintiva. Além do mais, o que nos difere dos demais mamíferos é supostamente a consciência do que estamos fazendo. E não estou falando de coisas que agridam os olhos do "Deus dos hebreus" porque isto é meramente uma interpretação humana, mas a milênios o homem vem desenvolvendo o que definimos por consciência. O homem é a própria natureza adquirindo consciência de si mesmo, pela própria lógica esta é uma definição muito além de qualquer credo religioso.
Assim sendo, tentar justificar que relação aberta é sair trepando com qualquer um que se sinta tesão e sem vínculo, enquanto se mantém um vínculo com um(a) parceiro(a)por namoro ou casamento é estagnar o processo de percepção humana. Imagine que até mesmo os gregos já falavam a respeito do sexo pelo prazer instintivo como um ato degenerativo de involução humana. E de fato, a fidelidade atribuída ao sexo é individual, daí existe o entendimento equivocado que os parceiros sejam tutores da nossa fidelidade. O sexo é um acesso onde conseguimos conectar nosso ser individual em nível físico, emocional, psíquico com outro ser humano individual e não apenas um "parque de diversões". Sem dúvida se devemos fidelidade é a nós mesmos para não macular nossa individualidade com qualquer experiência.
Pouco importa a questão monogâmica ou não, não entro neste mérito que senão o sexo classificado meramente como um processo de prazer instintivo. Não conheço uma única pessoa que depois de ter transado com um ou mais desconhecidos tenha encontrado realização, e tentem empregar qualquer outro termo como "fetiche, fantasia, etc" mesmo na imaginação qualquer ser humano busca se sentir realizado. É um limiar muito próximo a compulsão sexual, pois não há como definir o que seja realmente "saudável" em termos de relacionamento aberto, quando o sexo com terceiros tem um perfil instintivo. O que penso ainda a respeito do instinto poderia inclinar-me as falsas definições moralistas contra a homossexualidade, o que é bem diferente. O homossexual assim como o heterossexual é dotado da capacidade de sentir o amor incondicional através do sexo, não está pois entregue ao prazer instintivo meramente por se realizar com o mesmo sexo como os incautos possam pensar.
Não quero parecer severo na observação, mas lendo este texto sobre relacionamento aberto e o enfoque ao sexo como prazer pelo prazer me senti um gado amarrado pastando, sendo conduzido pelos desejos e impulsos do meu corpo, de processos meramente bioquímicos, desprezando o ensinamento dos mais antigos e sábios homens que existiram neste planeta. O compromisso que atribuímos a uma relação monogâmica, por exemplo, pode ser até uma necessidade meramente cultural, agora isto não significa que tenhamos nos alheios apenas um objeto de desejo, como um pedaço de carne depósito de esperma. Se quero saciar meus instinto sem nenhum vínculo mais humano e sim animal, então a masturbação já estará de bom tamanho.
 
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