quarta-feira, julho 16, 2008

 
Mutantes

No olho, fazendo parte da estrutura da retina, estão dois tipos de células receptoras chamadas de cones e bastonetes. Estas últimas, mais sensíveis a luz, contêm apenas um tipo de pigmento sendo assim responsável pela visão preto e branco. Já os cones, até onde se sabe, contêm três tipos de pigmentos (verde, vermelho e azul) e a ausência de um ou mais destes pigmentos acarreta em disfunções como a acromotopsia, onde o indivíduo apenas enxerga em preto e branco, como os cães; e o daltonismo, que é a presença de apenas dois destes pigmentos, impossibilitando o contraste correcto que define a cor.

Mas se o químico John Dalton apenas deu ao mundo parte deste conhecimento no século XVIII, como era encarada uma pessoa que sofresse de daltonismo até então?
Imagino quantas pessoas passaram por dementes, ou quantas outras não terão sofrido um castigo divino ou mesmo o toque do diabo. Ou então, imaginem quantas mulheres epiléticas podem ter sido jogadas à fogueira, acusadas de possessão demoníaca, ainda um século mais cedo.

No ponto da evolução humana em que nos encontramos, oficialmente, nossa mente lê o meio, reconhece-o visualmente, apenas considerando aquilo que está em 3 dimensões: Largura, comprimento e altura. Mas e aquilo ao que a mente não entende, aquilo ao que olho não enxerga, é tão simples quanto se afirmar: ‘Não existe!’?

Se a geometria euclidiana era o entrave da revolução física e foi preciso chegarmos ao século XX para que uma quarta e uma quinta dimensão fossem consideradas (na verdade consideram-se 10 ou 11 já), parece-me então, que estas posturas de determinação, de postulação do que é normal, natural ou não, hoje, são por demais inconsistentes, sem nenhuma consideração por qualquer referência histórica humana.

Tenho amigas que enxergam espíritos ao nosso redor. Tenho um amigo que capta fragmentos, sensações de pensamentos de pessoas a sua volta. Conheço quem seja afetado pelos estados emocionais de quem está ao seu redor. Estranho?
Não serão eles o equivalente aos daltônicos antes do século XVIII?

Notem: Temos a narrativa presenciada de aproximadamente 50 mil pessoas que estavam num mesmo lugar, ao mesmo tempo, quando, alegadamente, o sol teria girado sobre si mesmo na Cova de Iria, em Fátima, no dia 13 de Outubro de 1917.

Mesmo tendo sido um alegado fenómeno pontual, sem réplicas, milhões de pessoas desde então escolheram acreditar, postular que o evento se trata de um milagre, de uma intervenção divina.

Em paralelo, temos outros milhões de pessoas que diariamente, réplicas atrás de réplicas, afirmam, conduzem, provocam ou sentem manifestações as quais, talvez, não podem efetivamente ser evidenciadas, cabendo a nós, à semelhança do alegado efeito do sol em 1917, acreditar ou não. Via de regra, estas pessoas acabam por ter sua sanidade mental questionada.

O ser humano, como o vejo, se tem revelado tendencioso, limitado e oportunista nos seus julgamentos. O que o afasta da idéia de uma evolução espiritual promovida por uma religião, a geometria euclidiana contemporânea no caminho do real conhecimento da natureza do universo e, principalmente, da humana.

Pensem nisso.

Uma boa semana para todos. Amém.

Eduardo Divério.

Comments:
Há diferenças importantes entre o daltonismo e a "capacidade" de ver aquilo que parecem ser espíritos em redor das pessoas.

O daltonismo é uma condição que faz com que daltónicos e não daltónicos distingam diferentes características do seu universo visual, embora as duas interpretações da realidade cromática estejam ambas ancoradas na mesma realidade exterior e independente dos observadores. E é possível, objectivamente, determinar o comprimento de onda da luz emitida por qualquer objecto. Esses comprimentos de onda são intepretados de forma diferente por daltónicos e não-daltónicos, mas também dentro de cada um deste grupos nas regiões de fronteira. Eu acho que aquilo que muita gente chama verde clarinho é uma tonalidade de azul, por exemplo. Simplesmente os daltónicos têm uma capacidade diminuida para distinguir entre diferentes tonalidades.

Ter a capacidade de ver "espíritos" (porque pressentir pensamentos de pessoas à nossa volta todos temos, uns melhor outros pior), é uma experiência subjectiva e, consequentemente, não está ancorada numa realidade que possamos verificar objectivamente. Não duvido, à partida, da verosimilhança nem da intensidade das experiências visuais percepcionadas por essas pessoas, mas não se pode fazer um paralelo com o daltonismo.

Estou convencido que essas experiências visuais são geradas de forma endógena como, de resto, está amplamente documentado na literatura em neurofisiologia e neurocognição.

Concordo que o ser humano é tendencioso, limitado e oportunista, mas penso que isso se nota sobremaneira naqueles que se dizem inspirados por "uma evolução espiritual promovida por uma religião", de que não faltam exemplos no quotidiano.

Não creio que a crença religiosa ou uma intensa vida espiritual contribuam necessariamente para um melhor conhecimento do que é a experiência humana e muito menos da natureza do universo. Penso que há crentes e não crentes que têm abertura de espírito para poder ver para além da paroquialidade da sua condição presente e outros que não.

Penso que a honestidade intelectual e a pureza de sentimentos são os únicos requisitos para atingir o objectivo de conhermos melhor o que nos rodeia e nós próprios. Nem um, nem outro se adquire automaticamente com o comprometimento com uma religião ou uma qualquer escola de pensamento.
 
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