quinta-feira, junho 21, 2012

 

Interpretação



Ainda lembro-me do tempo quando ouvíamos no noticiário televisivo, ou líamos naquelas edições de revistas mais científicas, as últimas descobertas, tendências e teorias da medicina, do cosmos, da psicologia e, apesar de ficarmos um pouco confusos, até céticos, não nos púnhamos contra as elas, ou melhor, não negávamos ou ignorávamos a informação. Aquilo entrava para um centro de processamento interno e com o tempo, conforme a necessidade, ia-se lá recorrer a ela para auxílio de entendimento.

Mas hoje em dia o comum é, da pessoa comum, julgar e decidir, na hora, se a informação serve ou não serve e ainda justificar-se com:  ‘é a minha interpretação’.

Existe aí a nossa volta uma grande confusão entre interpretar uma música, uma coreografia ou até um poema e a interpretação de um texto.  A interpretação de um texto nada mais é do que a explicação, a clarificação ou até uma contextualização de um assunto, mas nunca num ponto de vista pessoal, numa divagação ou a associação de algo que tenha lembrado ao leitor. A isso chamar-se-ia interpretação livre, que é outra coisa.

Interpretar um texto requer dois importantes componentes: inteligência e conhecimento.

Quanto mais conhecimento se tem sobre o assunto escrito, quanto mais se sabe sobre o autor, suas obras, suas tendências, seu perfil, suas crenças, seu estilo, mais podemos cruzar estas informações, com inteligência, e concluirmos, fazer mais claro, explicarmos, daí com as nossas próprias palavras, sobre o que o texto realmente é. Mas nunca, mudar o conteúdo conceptual, filosófico, mudar a ideia que originou o texto!

Quando escrevemos, usamos do recurso de figuras de linguagem (ironia, eufemismos...) e muito frequentemente, recorremos a referências, frases, estrangeirismos também, que partimos do princípio que as pessoas sabem o que significa e que se não sabem, podem ir ao google. Estes temas condensados, abreviados, óbvios ao escritor, precisam por vezes ser clarificados, interpretados, de forma que façam mais sentido no entendimento do resto do texto.  Bem como compreender o que está implícito, o velho ‘nas entre linhas’, que requer uma atenção inteligente.

 Grosso modo, não é o que você entenderia da leitura e sim, o que autor queria realmente dizer, nas suas palavras! Logo, para mim, quando alguém se vira e diz: ‘mas essa é a minha interpretação’, esta pessoa só está afirmando que ou retém pouco conhecimento sobre o assunto ou que não é muito inteligente. Ou pior, os dois.

Mas eu vou mais longe. Denuncio aqui outro grupo de pessoas que se prevalecem desta confusão acadêmica e esgueiram-se, irresponsavelmente pela vida, deles e consequentemente pela nossa eventualmente, coletando as impressões do mundo numa linda forma livre de interpretação do mesmo. ‘É como eu vejo...’;  ‘...cada um tem a sua opinião’ e esta pérola, claro: ‘é o meu ponto de vista’.

Estou até nervoso! Este assunto deixa-me mesmo ‘puto’!

Terráqueos, ponto de vista se tem de política, sobre religiões (mas não se tem ponto de vista dentro de uma religião), gastronomia, turismo, arte (em termos de preferência, pois por exemplo, não suporto Picasso mas não posso negar que ele era um gênio), educação e mesmo psicologia, pois existe um grande dinamismo em suas existências.

Contudo, nós temos astrofísicos, matemáticos, engenheiros, psicólogos trabalhando por anos em áreas existentes há mais anos ainda e existe toda uma fundamentação, um embasamento acima de qualquer ponto de vista!!! Não que não possam ser criticados, que não possam ser questionados, mas não tolero que seja pelo beneficio do indivíduo senão do geral.

Pessoas que cultivam valores falidos ou tendenciosos, até meramente culturais, que se agarram em ideias que facilmente se contradizem com outras em seu próprio comportamento, simplesmente não tem responsabilidade para assumir uma ‘tarefa’ como lhe é apresentada.

Existem conceitos e funções arquetipicamente e conscienciosamente fundados, modulados, especificados e rotulados à cabeça de qualquer grupo de novos regras. Pai, mãe, filho, estudante, trabalho, medo, lar, dinheiro, saúde, sexo, neurose, patologia, felicidade, casamento, fidelidade e mais um oceano de outras palavras têm conceitos e funções irremediavelmente concretos e absolutos e a forma como dispomos isso tudo num discurso, ou no nosso comportamento, não foge à regra da interpretação e logo, não é como você pensa, dentro de seus limites, mas simplesmente o que as evidencias denunciam pela correlação de valores e conceitos. Tente você mascarar isso ou não.

Desejo a todos uma boa semana do ‘ponto de vista’ de onde estejam...

Eduardo Divério.

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