terça-feira, julho 17, 2012

 

A Morte não Avisa



Clássico; estava eu no trem retornando para casa, depois de assistir a parada gay em Londres, ter conversado muito com meus amigos, ter me divertido imenso e bebido alguns cocktails, quando resolvo ver as atualizações do meu Facebook pelo blackberry e lá estava, aquele tipo de mensagem que sabemos que pode chegar a qualquer momento, mas que nunca estamos preparados para recebê-la! Um primo direto meu havia falecido e meu irmão mais novo enviou-me a notícia.

Levamos um susto, tornamos a ler a mensagem de novo, a respiração altera-se e há uma ligeira descarga de adrenalina no plexo solar. Para mais, porque não estamos nada à espera que parentes mais novos do que nós, numa faixa etária ainda anterior à segunda idade, partam assim, vítimas de doenças.

Na hora pensei na minha mãe, tia próxima do falecido, e do quanto ela poderia estar amedrontada por projeções dela em consequência àquela súbita e inesperada perda, afinal, não é suposto uma mãe enterrar um filho e vivendo ela tão longe de dois de seus filhos, como seria?

Depois lembrei-me de meu irmão caçula, que não só era mais novo do que nosso primo, como também andaram juntos na escola, brincavam juntos e seguiram amigos pela vida adulta. Estaria ele também, alegadamente, amedrontado pela projeção que algo possa lhe acontecer longe de sua família? Estaria eu?

Há alguns anos eu fiz uns acordos com a Vida e com a Morte. Ser um emigrante por mais de 20 anos e ter passado pelas situações que passei, acredito, encaminharam-me de alma leve a esta reunião com as duas ‘entidades’. Mas por mais preparados e avisados que sejamos, é possível que continuemos sendo a mesma pessoa depois de um funeral?

Perda é perda, ponto.  Mas desde antes da descoberta do fogo, muito antes do surgimento da nossa espécie, já se sabia que perdemos parentes, amigos e vizinhos, mas mesmo assim, mais de 195.000 anos depois, ainda precisamos de rituais, ainda sofremos e caímos em profundo estado depressivo perante a morte daqueles que significam algo para nós.

Como que o evento mais inequivocamente seguro que ocorrerá na sua Vida, como que depois de idades de gelo, cataclismos, pragas e pestes, Holocausto, sífilis e AIDS ainda lemos a ‘mensagem’ atônitos, incrédulos, como se alguém no céu tivesse se enganado ou sendo injusto conosco?

Ainda mais estranho para mim é pensar que maioritariamente as pessoas pelo planeta acreditam num Deus e numa crença, que via-de-regra, guia, regula e prepara as pessoas através de suas vidas de forma a se prepararem para suas ‘vidas’ a seguir à morte. Mas se passamos a vida a modular nossas ações porque não só acreditamos que existe um seguimento, como queremos garantir um passe de entrada nesta dimensão, por que raio sofremos tanto?

Saudade, ausência, hábito... sim, está bem. Mas sofrer? Estamos muito longe de sermos uma civilização equilibrada com a nossa natureza. Negação é o que melhor sabemos fazer. Contudo, para mim, negar, não pensar, não aceitar, não querer falar que a morte é parte da vida, ainda é menos grave do que aquilo que fazemos para manter este pensamento esquecido. Viramo-nos para crenças e promessas, chegamos a modular nossa própria vida por elas, pedimos perdão por pecados e tolhemos nossa própria liberdade ‘espiritual’ sem que esta crença pareça nunca ser o suficientemente forte para suportar o inevitável.

Esperamos que nossa morte venha pela velhice, mas pode vir por acidente ou doença. E pode ocorrer daqui a um, dez ou 30 anos. A qualquer hora. E estarmos cientes disso deveria ser a nossa crença mais suprema! Para que não nos submetêssemos tanto a regras estúpidas, para que soubéssemos aproveitar mais e melhor cada momento, cada companhia. Para que a morte de pessoas próximas não nos jogue na cara o quanto nossa vida está atada, o quanto nos forçamos por caminhos que no fundo não nos dizem nada, o quanto certo e errado varia de sotaque para coordenada geográfica para uma idade!

Não tem mestrado ou carreira que compense você ter perdido os primeiro passos do seu filho! Não há promessa feita que justifique levar uma vida em desânimo! Não há mal que não passe! Tem mais gente interessante por se conhecer do que viver na saudade ou lamentação de quem nos esqueceu! Viaje, ame, namore e mantenha seu Facebook sempre ativo, mas não se prive de viver ou não morra antes do tempo.

Que sejamos bravos e avisados de nossa frágil natureza. Afinal, para morrer basta estar vivo.

Uma semana cheia de vida para todos!

Eduardo Diverio.

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