terça-feira, setembro 18, 2012
O Silêncio dos Inocentes (até que se prove o contrário?)
Tem sido
impossível, devido aos bombardeamentos do Facebook,
não ler as mais diversas mensagens sobre o quão inspirador, inteligente,
maduro e sábio, é usar do silêncio. E eu começo a cansar um bocado disso. Com
exceção de um bom final de semana no campo, longe daqueles vizinhos ruidosos, daí
no silêncio, o papo de viver em silêncio, enerva-me!
Se quem
cala consente, mas o silêncio é o melhor desprezo que se pode dar a alguém, ou
a alguma coisa, como exactamente estamos marcando uma posição?
Eu já vivi o
suficiente para saber que quando a água sobe de mais, erguemos os pezinhos, ah
erguemos, erguemos! E papai Freud também dizia que quando a dor atingir
o insuportável, a pessoa ‘grita’. Mas se gritar gera o efeito absolutamente contrário
do que se esperava com o silêncio, levando à cabo todo um período de
tranquilidade, será mesmo inspirador,
inteligente, maduro ou sábio, sustentar algo até que realmente doa à morfina?
Está bem, você
pode estar a pensar naquele silêncio causado mesmo por descaso ou
despreocupação, daquele tipo que nunca dor alguma aumentaria a ponto de lhe fazer
gritar. Mas seremos surdos aos gritos daqueles a nossa volta? Especialmente
aqueles envolvidos nesta pseudo tranquilidade?
Pois chega
de tantas interrogações! O silêncio de um, pode causar dor insuportável noutro
e convenhamos: Você não estava rezando
em meio a isso tudo!
Com isso quero
dizer que o silêncio dá a falsa sensação de tranquilidade, que nada está
acontecendo, que não temos
responsabilidades com o evento e daí, um pouco infantil, talvez, é-me difícil
não lembrar do ‘Pequeno Príncipe’ ou ‘O Principezinho’, na versão lusitana.
Claro que
não estou me referindo aqui à bate-boca, à discussões acesas e sequer debates,
onde de facto sim, o silêncio pode ser mestre. Refiro-me àquilo que envolve as
emoções, os sentimentos e as sensações das pessoas que de alguma forma, formam
uma intersecção com nossas vidas.
O silêncio,
disfarçado de sabedoria Chinesa ou Hindu, quando não relacionado única e
exclusivamente a um processo interno nosso, à algo que só afeta a nossa pessoa,
denota irresponsabilidade, vergonha (matura ou imatura), medo, insegurança,
preguiça, negação, procrastinação, má organização mental de ideias e muita
angústia naquele à espera de uma palavra.
Há sempre
algo que pode ser dito, quanto mais não seja, que se diga não ter condições de
se falar sobre o assunto, mas é um direito de um, gritar quando sente dor,
justa ou injustamente. Contudo, não será o silêncio um bom juiz para isso.
Desejo à
todos uma silenciosa semana de introspecção para se saiba e se possa, sempre,
saber o que dizer e se quebrar o silêncio com inspiração, inteligência,
maturidade e sapiência.
Eduardo
Saldanha Divério.
terça-feira, setembro 04, 2012
‘Que Deus me a leve que não a acolho de criada!’
A primeira vez que eu ouvi isso, eu sequer
consegui compreender o que me diziam. Mas não me refiro apenas ao sentido do
dito, pois não conseguia distinguir também a fonética de onde terminava uma
palavra e começava outra, naquela miscelânea consonantal com vogais
estranguladas.
Finalmente, lá minha colega pôs tudo por
escrito e de seguida contou-nos que sua tia, já uma senhora, era quem lembrava destas
palavras vindas de sua própria mãe, com os braços atirados ao firmamento e uma
expressão de sofrimento a proferir… o título deste texto. Diz-se que a miséria
em que viviam era tamanha que aquela pobre mãe pedia a Deus que poupasse sua
filha de tanto infortúnio e que assim a levasse para o céu, já que ela não tinha
condições de lhe criar.
Bem, verdade é que Deus não levou a menina para
o céu e a mãe, bem ou mal, ainda acabou por ‘acolhe-la’ de alguma forma. Mas se
ter chegado à terceira idade não foi tempo o suficiente para esquecer a
rejeição, maternal e divina, e se afinal tudo já passou, por que esta lembrança
segue viva?
Todos nós temos sensações a viverem
clandestinamente dentro de nós que, apesar de serem adversas e até não
relacionais com o adulto que somos hoje, parecem que sempre lá estiveram, por
lá sempre habitaram, por vezes até na voz de outra pessoa. Ecos…
Enfim, mas por que eu trouxe esta lembrança à
tona? Primeiro, porque desde que regressei à Portugal que não havia escrito e
não queria um texto óbvio sobre migração e mudanças. Mas ao mesmo tempo, como é
o propósito do meu blog, não poderia deixar de registar esta fase, esta
transição que tenho vivido, lenta, longa e demorada.
É difícil eu relembrar esta história e não
pensar que eu mesmo tenho andado atrás de ser ‘acolhido’, mas numa dimensão
exponenciada, pois diria que mais pela vida do que por alguém. Contudo, à
semelhança do conto, nem os céus se abrem e nem eu encontro o conforto, mas de
qualquer jeito, de algum jeito, lá sigo eu para terceira idade.
Então resolvi pôr por escrito a tal frase, que
me lembra a tal história, onde mesmo quando parece não haver esperança, mesmo
quando parece não haver recurso, a vida segue seu curso, despreocupada, conosco
de arrasto, uma idade atrás da outra. Mas então, para que sirva de algo, que
seja para eliminar, impedir, evitar a fonte produtora de ecos, desses que se
propagam pelo tempo em forma de lembranças. Com isso quero dizer que, qualquer
que seja o jeito, desde que dê jeito, que seja pleno, só por ser parte do hoje.
E isso é um desejo. Também uma sugestão.
Se o
‘céu não me leva’ (sem conotações suicidas, por favor) e se a vida ‘não me
acolhe de criado’ e porque cá se segue, que seja pelo melhor. Que se desenvolva
a capacidade de fazer o melhor e que o deixe vir!
Dedico este texto à todas as pessoas que hoje
precisam de algum acolho na alma.
Uma boa semana à todos.
Eduardo Divério.