sábado, junho 30, 2012
Vamos Em Frente Que Atrás Vem Gente!
Cansava-me
imenso, há muitos anos, o papo daquela gente mais velha que vazia uma onda
enorme quando descobriam que havíamos nascido depois de algum grande evento
mediático, ou histórico, ao qual eles tinham presenciado. Como se não fôssemos capaz de avaliar a
dimensão e a importância do acontecido.
Mas hoje
entendo de onde vem este comportamento. Lembro-me da expressão de choque no
rosto de minha mãe, seguido das lágrimas que lhe escorreram pela face, quando
assistíamos ao Jornal Nacional em 1977 e neste fora anunciada a morte de Elvis
Presley. Uma dor, um vazio que só compreenderia com a Perda de Cazuza, Renato
Russo e tantos outros, anos mais tarde.
Carregamos
as impressões emocionais dos diversos estágios de nossa vida conosco. Mas não será
isso muita coisa para se carregar? Se à medida que envelhecemos, perdemos força
e velocidade, não estará este peso, quiçá, nos retardando? Ou simplesmente nos
fazendo mais cansados?
Existe, sem
a menor sombra de dúvida, um conforto maior, hoje, entre os amigos de idade
relativamente equilibrada, pois alcançamos aquele ponto na vida onde somos
livres, quero dizer, ‘desatachados’ do que esperam de nós e somos mais transparentes
no nosso naturalmente ‘eu’. Algo como ‘já cagamos fora do penico’, já
desapontamos a quem mais nos amava, quem mais nos ama já se acostumou com nossa
natureza e isso tudo torna o viver mais leve e autêntico.
Mas ao mesmo
tempo, junto com este conforto do ‘estar-se’, temos uma mala cheia de ‘isso não
quero mais’, menos esperanças e os sinais do envelhecimento à mostra por todo o
lado! O lado de trás é o pior! ahahahahahahahha
Mas eis que
senão quando, aquelas pessoas que estão na minha vida, e que nasceram depois da
morte da Elis Regina, ou enquanto eu estava no cinema assistindo ‘Back to the Future’,
ou ainda depois da queda do muro de Berlim,
lembram-me de pequenas coisas, gestos, bobagens, de pequenos sonhos e do quanto
temos a tendência a rotulá-los de ‘coisas da juventude’ e que talvez, só por
causa deste rótulo, não estejam dentro da tal mala!
Não me
refiro aqui a ignorar a noção do ridículo - altamente debatível também, mas não
hoje - e nem aquele papo estranho de ‘vivermos
nossa criança’... não somos mais crianças,
não somos mais jovens, mas estamos vivos! E devíamos celebrar mais e melhor
esta aventura! E talvez daqui advenham estas comparações com infância e
juventude, quando não tínhamos o peso da vida, nem da gravidade, a nos puxar
para baixo! Ter rasgos de espontaneidade, cantar, correr descalço, tomar banho
de chuva, dançar de madrugada na rua, roubar aquelas amoras lindas do vizinho,
beber com amigos, viajar 100 km só para tomar café numa praia linda, namorar,
flertar, sonhar, idealizar, enfim!
Eu dedido
este texto aos meus mais velhos amigos, mas também faço dele um agradecimento
aos meus mais novos, por ajudarem-me a lembrar que no ‘chaqualhar da charrete’
perdemos coisas que caem pelo caminho, mas que sempre terá um vilarejo mais à
frente onde poderei repô-las!
Uma boa
semana a todos!
Eduardo
Divério.
quinta-feira, junho 21, 2012
Interpretação
Ainda
lembro-me do tempo quando ouvíamos no noticiário televisivo, ou líamos naquelas
edições de revistas mais científicas, as últimas descobertas, tendências e
teorias da medicina, do cosmos, da psicologia e, apesar de ficarmos um pouco
confusos, até céticos, não nos púnhamos contra as elas, ou melhor, não
negávamos ou ignorávamos a informação. Aquilo entrava para um centro de
processamento interno e com o tempo, conforme a necessidade, ia-se lá recorrer
a ela para auxílio de entendimento.
Mas hoje em
dia o comum é, da pessoa comum, julgar e decidir, na hora, se a informação
serve ou não serve e ainda justificar-se com:
‘é a minha interpretação’.
Existe aí a
nossa volta uma grande confusão entre interpretar uma música, uma coreografia
ou até um poema e a interpretação de um texto.
A interpretação de um texto nada mais é do que a explicação, a
clarificação ou até uma contextualização de um assunto, mas nunca num ponto de
vista pessoal, numa divagação ou a associação de algo que tenha lembrado ao
leitor. A isso chamar-se-ia interpretação livre, que é outra coisa.
Interpretar
um texto requer dois importantes componentes: inteligência e conhecimento.
Quanto mais
conhecimento se tem sobre o assunto escrito, quanto mais se sabe sobre o autor,
suas obras, suas tendências, seu perfil, suas crenças, seu estilo, mais podemos
cruzar estas informações, com inteligência, e concluirmos, fazer mais claro,
explicarmos, daí com as nossas próprias palavras, sobre o que o texto realmente
é. Mas nunca, mudar o conteúdo conceptual, filosófico, mudar a ideia que
originou o texto!
Quando
escrevemos, usamos do recurso de figuras de linguagem (ironia, eufemismos...) e
muito frequentemente, recorremos a referências, frases, estrangeirismos também,
que partimos do princípio que as pessoas sabem o que significa e que se não
sabem, podem ir ao google. Estes
temas condensados, abreviados, óbvios ao escritor, precisam por vezes ser
clarificados, interpretados, de forma que façam mais sentido no entendimento do
resto do texto. Bem como compreender o
que está implícito, o velho ‘nas entre linhas’, que requer uma atenção
inteligente.
Grosso modo, não é o que você entenderia da
leitura e sim, o que autor queria realmente dizer, nas suas palavras! Logo,
para mim, quando alguém se vira e diz: ‘mas essa é a minha interpretação’, esta
pessoa só está afirmando que ou retém pouco conhecimento sobre o assunto ou que
não é muito inteligente. Ou pior, os dois.
Mas eu vou
mais longe. Denuncio aqui outro grupo de pessoas que se prevalecem desta
confusão acadêmica e esgueiram-se, irresponsavelmente pela vida, deles e
consequentemente pela nossa eventualmente, coletando as impressões do mundo
numa linda forma livre de interpretação do mesmo. ‘É como eu vejo...’; ‘...cada um tem a sua opinião’ e esta pérola,
claro: ‘é o meu ponto de vista’.
Estou até
nervoso! Este assunto deixa-me mesmo ‘puto’!
Terráqueos,
ponto de vista se tem de política, sobre religiões (mas não se tem ponto de
vista dentro de uma religião), gastronomia, turismo, arte (em termos de
preferência, pois por exemplo, não suporto Picasso mas não posso negar que ele
era um gênio), educação e mesmo psicologia, pois existe um grande dinamismo em
suas existências.
Contudo,
nós temos astrofísicos, matemáticos, engenheiros, psicólogos trabalhando por
anos em áreas existentes há mais anos ainda e existe toda uma fundamentação, um
embasamento acima de qualquer ponto de vista!!! Não que não possam ser
criticados, que não possam ser questionados, mas não tolero que seja pelo
beneficio do indivíduo senão do geral.
Pessoas que
cultivam valores falidos ou tendenciosos, até meramente culturais, que se
agarram em ideias que facilmente se contradizem com outras em seu próprio
comportamento, simplesmente não tem responsabilidade para assumir uma ‘tarefa’
como lhe é apresentada.
Existem
conceitos e funções arquetipicamente e conscienciosamente fundados,
modulados, especificados e rotulados à cabeça de qualquer grupo de novos
regras. Pai, mãe, filho, estudante, trabalho, medo, lar, dinheiro, saúde, sexo,
neurose, patologia, felicidade, casamento, fidelidade e mais um oceano de
outras palavras têm conceitos e funções irremediavelmente concretos e absolutos
e a forma como dispomos isso tudo num discurso, ou no nosso comportamento,
não foge à regra da interpretação e logo, não é como você pensa, dentro de seus
limites, mas simplesmente o que as evidencias denunciam pela correlação de
valores e conceitos. Tente você mascarar isso ou não.
Desejo a
todos uma boa semana do ‘ponto de vista’ de onde estejam...
Eduardo Divério.
segunda-feira, junho 18, 2012
Mentir ou não Mentir? Eis a questão.
Vamos lá
conversar como adultos! Mesmo porque, eu não escrevo para adolescentes e muito
menos para crianças.
Sempre
chamou-me a atenção aquelas pessoas que, enquanto ‘solteiras’, viviam
envolvidas em relações impossíveis, apaixonadas por pessoas indisponíveis ou já
comprometidas, mas sempre convencidas que não tinham culpa, pois que não se
escolhe a quem se ama e não se controla o que se sente. Contudo, estas mesmas
pessoas, depois que deixavam de ser ‘solteiras’, passavam a exigir domínio, uma
razão, um autocontrole de seus cônjuges, como se o casamento lhes tivessem
mudado organicamente e logo, não mais sentimentos ou emoções, mesmo sensações,
pudessem ter, que não fossem por seus cônjuges.
Esse tipo
tácito comum de compreensão das relações, para mim, por si só, já explica o
quão impossível é viver numa relação sem mentir! Mas não me refiro aqui a
mentiras danosas, a atos egoístas ou irresponsáveis que concretizam de fato uma quebra de confiança. Refiro-me ao
universo íntimo e conceptual de cada individuo.
Por
exemplo: imaginem um casal de regresso de uma festa, no carro, o marido ao
volante, mas com um ar distante, pensativo quiçá. A esposa pergunta-lhe:’ que
ar é este? O que pensas?’
De que
jeito o marido poderia dizer: ‘estou lembrando das mamas daquela loira de
vestido vermelho! Imaginando o que eu faria se eu tivesse só dois minutos a sós
com ela!’? Impossível, certo?
O casal
recebe o sócio do marido para jantar em casa e com a saída dele, o marido
pergunta o que ela achou do sócio. Poderia ela ser honesta e dizer: ‘eu não
aguentava mais estar perto dele, pois ele é irresistivelmente atraente e o
cheiro dele estava me deixando louca!’?
Ok, são
dois exemplos clichés, mas acho que
ilustram a dimensão ao o que me refiro.
Ninguém tem
o seu campo sensorial desativado, desligado, lobotomizado porque está amando
alguém, porque tem um compromisso com alguém. Nossa estrutura cerebral não muda
em relação à emoções e sensações porque conceptualmente nos ligamos a alguém numa
relação. Amor é um sentimento e atração é uma sensação que pode espoletar uma lembrança
e nos dar saudade, nos fazer emotivos por reação.
Mas TODOS,
em níveis diferentes, por causas diferentes, precisam gerir isso. Fica-se calado,
quieto, a espera que as coisas passem. Ignora-se até, ou ainda, tenta-se
entender sua intensidade e o porquê da sua presença. Enfim, via-de-regra, priorizamos
as coisas e nossos compromissos e viramos a página. Contudo, sempre nos
atrairemos por aquilo ao que exerce atração sobre nós! O que fazemos com isso é
o nosso comportamento e apenas isso é passível de ‘julgamento’ em caso de haver
um ‘tribunal’!
Ser leal a
uma ideia, a um projeto, é manter-se ligado a ele, é mantê-lo vivo e isso
implica e exige controle, compreensão, estar-se bem com suas escolhas. Mas não
espere estar imune a nenhuma ‘tentação’, não espere não sentir e reagir a novos
sabores e novos odores! Isso não existe! E não só! É saudável e meramente humano.
Mas infelizmente,
é necessário mentir. Sim. Que bem pode trazer em se confessar ao seu cônjuge que
ontem, por 20 minutos, sentiu um tesão violento por este ou aquele? O que
isso faz a autoestima do seu cônjuge? As bobagens desnecessárias que podem
surgir como projeção por causa desta fantasia!
O que
alguém que vive conosco, que abre mão de coisas, que se priva de outras, que
também gerencia suas sensações por lealdade, pode sentir ao ouvi-lo
questionar-se em voz alta durante um breve momento existencial de
arrependimento?
Omitir e
mentir pode fazer parte de um processo de restauro, de reset, de manutenção, de certificação e de busca de certezas! Não
são necessariamente negativos, pejorativos e são de ordem privada, sequer
qualificariam um segredo.
Mentir e
omitir neste nível, onde comportamento nenhum ofende ninguém, são armas
psicológicas do homem do século XXI para manter-se leal ao seu plano. Fazem parte
de um processo.
Ninguém
está livre de confusões e de incertezas e cada um tem a sua forma de enfrentar
os problemas e mais difícil fica quando para além do nosso querer, ainda temos
que equacionar o respeito que temos por aquela pessoa que vive conosco.
Que sejamos
mais avisados da nossa estrutura humana e que os fins nunca justifiquem os
meios.
Uma boa
semana a todos.
Eduardo Divério.
sexta-feira, junho 15, 2012
Amor, Lealdade e Compromisso
Enquanto o
rei George V da Inglaterra encaminhava-se para sua morte, fraco de longa
doença, o príncipe de Gales, Edward Albert Christian George Andrew Patrick David, herdeiro imediato do trono
britânico, estava escandalizando o mundo com o seu caso amoroso com Wallis Simpson,
uma senhora casada e já divorciada uma vez.
Edward
subiu ao trono. Willis divorciou-se pela segunda e o desposou. Devido à
pressões de ordem sócio-política, mais política, Edward VIII decide por abdicar
do trono e parte com sua esposa em exílio para a França, dando origem a mais famosa história de
amor do século XX.
Durante o
exílio, cartas foram trocadas entre a Duquesa de Windsor e sua melhor amiga,
onde ela expressava o quão cárcere sentia-se com todo o condicionamento gerado pela
abdicação do rei e pelo senso de obrigatoriedade que passou a carregar em sua
alma. Diz-se, alegadamente, que ela comentava que depois do que ele fizera, ela
não teria outra escolha senão ficar com ele para sempre.
Estas
alegações deixam claro que a história mais romântica do século XX, afinal,
sustenta um conto de amor apenas quando narrada pela versão de sangue azul,
pois que, quando vista pelo ângulo yankee,
surge uma conotação que embora também fale de abdicação, acaba por não se
calcar tanto no amor, mas mais em lealdade e compromisso.
Claro que
estamos falando do ano de 1936, onde nem a segunda grande guerra ainda havia
mudado a face da Europa. Uma época onde mulheres ainda preocupavam-se em zelar
por sua reputação. Uma época em que pessoas sérias casavam-se para a vida. Uma
época em que Freud e Jung ainda chamavam a psicologia de ‘movimento’ e faziam lobby para angariar simpatizantes.
Mas o
século XXI revela uma mentalidade mais complexa, mais incoerentemente confusa
onde ainda encontramos pessoas em ‘movimentos’ pelos valores do século XX, mas
mais ainda, pessoas vivendo em total mistura de valores dos dois séculos. Sejam
eles compatíveis ou não.
Mas num
tempo onde a maioria das pessoas acredita que o casamento deve ser para sempre,
mas que caso não dê certo, o divórcio é mais do que bem-vindo, o que exatamente
significa lealdade e compromisso?
Eu acredito
que vivemos numa época onde nos permitimos questionar sentimentos e ouvir
sensações. Sou um militante da psicoterapia, pois acredito que a primeira fase
adulta de uma pessoa está repleta de grilhões emocionais, de culpa, de
obrigações, de memórias de emoções vividas, que nos afastam da nossa real
sensibilidade, do nosso ‘eu’ livre. Por isso, postulo que toda a pessoa que
cresce, que amadurece, desfar-se-á, provavelmente, de valores, de conceitos que
lhe foram passados como educação, mas que de efeito, sentido algum alguma vez
tiveram para esta pessoa.
Em 1936 não
existia a noção deste nível de crescimento psicológico e acredito que a segunda
fase adulta de uma pessoa fosse baseada em resignação.
Lealdade e
compromisso continuam sendo partes fundamentais do sucesso de uma relação;
alimento eu diria. Lealdade e compromisso tem uma escala ampla de
responsabilidades, de efeitos e bases, mas que só se formaram, só tem sentido em
existir, neste século, pela proposta de duas pessoas que se juntaram. Suas
funções é manter este amor vivo, é manter esta relação sempre o mais próximo
possível da proposta original.
Uma vez ter
havido deficiência em mantê-la, de qualquer parte, forçar uma lealdade ou
socorrer-se do compromisso seria aprisionar uma alma. Teimosia...
As pessoas
mudam. As pessoas descobrem-se. As pessoas compreendem-se. As pessoas atingem uma idade onde vislumbram
novas metas, novos sonhos e novos limites. Contudo, e inevitavelmente, isso é
um processo constante, vitalício e intemporal. Gostemos nós disso ou não.
Amor, mesmo
amizade, é algo que podemos sentir vindo de outra pessoa. Lealdade e
compromisso são algo que apenas podemos observar, e isso, é porque ocorre numa esfera
a nível individual, que só pode afetar uma outra pessoa pelo sentimento que as
liga.
Uma pessoa
leal é uma pessoa que vai a ‘guerra’ e luta com lealdade, com afinco, com
devoção, para manter uma proposta original, para defender suas fraquezas, para
manter uma chama acesa! Uma pessoa leal usa de todas as armas disponíveis e
esmera-se pelo seu compromisso.
Mas a
verdade é que nem todas as guerras são ganhas e todos sabem o quanto,
eventualmente, uma guerra empobrece um estado e debilita a identidade de uma nação.
Porém, isso não desqualifica o brio de um ‘soldado’.
O
compromisso já tem aquele cunho mais jurídico, um predicado que descreve uma
certa obrigatoriedade...
Eu
realmente acredito que estas três ‘entidades’ podem, ainda, neste século, criar
lindas histórias de amor, mas também, podem ainda encobrir e aprisionar outras tantas
mais confusas ou menos esclarecidas...
Desejo de
coração que o amor seja inspiração para sua lealdade com a qual se luta por um
compromisso.
Uma boa
semana para todos.
Eduardo
Divério.
quarta-feira, junho 06, 2012
Os Problemas dos Outros
Eu realmente
acredito que existe uma tendência a se ajuizar a intensidade, a densidade dos
problemas daqueles que nos rodeiam. Eu até diria que não se tende a achar, ao
menos com frequência, que os nossos problemas sejam mais sérios ou maiores do quê os dos outros, num
senso egodistônico, mas diria que se tende a subvalorizar o que as outras
pessoas estão passando como problema. A não ser que seja câncer, morte por
acidente, coisas bem genericamente dramáticas, onde facilmente qualquer um
consegue projetar e se identificar com a tragédia.
As pessoas
estão em estágios diferentes de suas vidas, em idades diferentes, e isso por si
só, provoca uma interação forçosa de nós com estas coisas adversas que sequer
precisamos. Com isso quero dizer que lidamos com pessoas ‘chave’ na nossa vida
na base diária e estas pessoas são familiares, colegas, chefes, professores e
todos com idades, credos, sexualidades, times de futebol e partidos políticos
diferentes e isso vem-nos à força. Não podemos escolher as áreas das vidas das
pessoas com as quais queremos ou não nos relacionar, pois estas são um todo de
partes.
E aqui
surge o truque. Temos o poder de nos desligar, de dar menos atenção àquilo que
pouco nos interessa. Contudo, com isso, parte fundamental desta pessoa de convívio
diário se perde e nesta perda também se vai nossa chance de perceber o porquê
esta pessoa lida com ‘isso’ ou ’aquilo’
daquele jeito, ou por que 'aquilo’ lhe afeta tanto quando, talvez, para nós ‘isso’
sequer faz sentido.
Uma avó que
vive longe de seus netos e que anda aflita pelas lojas, à procura de presentes
para uma visita a eles, há muito esperada, sem ter ideia do que comprar, não é
menos sério ou menos angustiante do que um adolescente que se sente preso, sem
liberdade na casa de seus pais, mas que ao mesmo tempo, não quer perder o
conforto, num amplo sentido da palavra, que lá conhece e sente. E nenhum destes dois
exemplos é menos sério do que, por exemplo, a crise de um quarentão enfrentando
um divórcio ao fim de quinze anos de casamento.
As pessoas
estão em pontos diferentes em seus ‘planos de vida’ e são afetadas de forma
diferente pelas dificuldades que surgem e no fundo, estão todos lutando para
ser feliz, para alcançarem seus sonhos.
Não tenho a
pretensão de sugerir o exercício deste tipo de percepção, este tipo de análise.
Acho que isso transformaria a vida em algo ainda mais complicado, mais denso do
que já é para cada um, com cada um daquilo que este um sente como problema. Mas
acho que vez por outra, ser lembrado disso, desses mecanismos humanos da
psicologia, onde defesas se transformam em ataques, nos ajuda a dar uma
calibrada, uma amenizada e até uma parada em processos desnecessários que mais
nos envenenam do quê, na verdade, procuram algum tipo de bem par nós. Entre nós e aqueles com quem lidamos na base
diária.
Talvez não
julgar tanto, ou simplesmente reconhecer a legitimidade da dor alheia, seja o
suficiente.
Olhar o
problema de outros, pelos nossos olhos, pelo nosso entendimento, é como ver um
filme do Jean-Luc Godard ou David Lynch e ousar dizer que o entendeu, depois de
só se ter visto uma vez! É como fazer uma... piada estúpida.
Uma boa
semana para todos.
Eduardo
Divério.