segunda-feira, março 26, 2012

 

Além da Vida. Mas não esqueça do que existe antes...


Há dias li no jornal que uma senhora, ao retornar do hospital onde fazia quimioterapia, vivendo num período pós-cirúrgico, encontrou seu marido e único filho, de cinco anos, mortos em casa, asfixiados por um vazamento de gás de uma das bocas do fogão na cozinha.

É-me difícil imaginar, conceber tamanho impacto como este sobre a vida de alguém. Sabemos o que é perder um ente querido, já experienciamos acidentes, perda de emprego, falta de dinheiro, mas algo assim... caramba! Como e por quê se sobrevive a algo assim? Quais valores são suficientemente fortes para nos suportar num embate destes?

Tenho vivido, talvez, na cidade que alberga a maior concentração de diferentes credos no planeta.  O mais notável, para mim, é manterem seus costumes, suas tradições, não só na religião mas também na alimentação e no vestuário.  Quando estamos num trem, podemos sentir os odores tanto de um Big Mac como um de Pita Shawarma e numa liquidação da Selfridges, por exemplo, nos encontramos cercados de protestantes Sul Americanos, Indianos e Árabes (com suas burkas).

Pois virei-me então para esta mesma cidade e perguntei-lhe como se sobrevive a um impacto assim. Os Católicos disseram-me que era a vontade de Deus, que ela deveria manter a fé, pois que no ´céu’ não haveria dor, doença ou perdas. Os Espíritas chamaram-me a atenção para o processo do karma, do quão mais perto de uma dimensão perfeita ela teria ficado; ainda que pudesse ter que voltar umas 48 vezes. Os Judeus puseram a culpa no fabricante de fogões e queriam processar a empresa e pedir uma indemnização para a senhora;  assim ela viveria confortavelmente até a sua morte, ou a chegada do Messias.  Os Mulçumanos não entenderam a minha preocupação com a mulher, ponto. Os Hare Krishna abraçaram-me forte e sem nada dizer, começaram a cantar e a dançar. Os Budistas explicaram-me que tudo na vida tem um início e um fim, que tudo é um ciclo e eu? Com cara de pombo... Os psicanalistas detiveram-se ao ato de auto sabotagem do marido, que não suportando a ideia de ficar viúvo,  e responsável por uma criança, inconscientemente, deixou um bico de gás aberto. Mas antes que pudéssemos falar da mulher, o tempo da minha sessão acabou. E os Universais do Reino de Deus foram categóricos em afirmar que Satanás havia tomado aquela casa e que somente depois dela fazer uma choruda contribuição financeira, o Senhor iria guiá-la na sua dor. Mas não me disseram para onde.

Mas eu seguia aflito. Seria a promessa de uma vida melhor após a morte, o suficiente para ela seguir acordando, comendo, dar água às plantas e comida aos peixes, ir à feira, tomar um tylenol para dor de cabeça e continuar indo a químio?

Quando a promessa do que vem depois é tão absurdamente perfeita, ter fé é mesmo a resposta para aguentar à espera?  A mesma espera por algo que, apesar de milhões de anos, é simplesmente um dos fatos da vida mais temidos de se ultrapassar ainda hoje?

Enquanto eu pensava, lembrei-me de Jó e de sua história, encontrada no seu livro homónimo na Bíblia. Jó perdera tudo e a todos, mas antes de sua morte, alegadamente, Deus proveu-lhe tudo de volta,  melhor  e com mais abundância. Ou seja, antes da vida perfeita, e de sua morte, ele voltou a ser feliz, ele seguiu com sua vida, com as coisas que esta vida ‘esperava’ dele, e pelo jeito, Deus também.

Eu acredito que nada na vida é por acaso. Acredito que tudo está interligado, gerando uma cadeia de sequência de eventos e que cada um destes  eventos gera as suas próprias consequências, gerando novos eventos. Mas também acredito que na crença do ‘nada ser por acaso’, não existe a obrigatoriedade de haver uma lição por se aprender, uma razão aplicável ao nosso presente, ou algo que só venha fazer sentido anos no futuro.  Pois afinal, ‘um charuto, às vezes, é apenas um charuto’.

Não existe uma escala ‘Richter’ que meça a dimensão de desespero de um mau evento na vida das pessoas. Estou certo que um adolescente que precise mudar de país para acompanhar a carreira de seu pai, deva sofrer  e amargura-se tanto, no seu limite, como o evento que abre este blog.  Apesar de parecer ridículo e injusto, apenas calca-se na relatividade das idades, das maturidades e valores de cada um no seu tempo/espaço.

Quando penso nas piores ‘dores’ que tive, concluo que minha pessoa não se inspirou no céu (tive formação Católica) ou no divino, mas no mero fato de apenas se estar vivo. Porque a probabilidade massivamente maior é que amanhã acordarei de novo, respirando, precisando comer  e que seja por acaso, vontade divina ou reação físico-quântica, é uma nova chance, é mais uma oportunidade de se viver tudo o que de maravilhoso existe neste planeta, neste plano, nesta dimensão e isso faz-me sentido.

Faz parte desta vida chorar por dor e perda, as vezes mesmo por anos. Faz parte desta vida errar e aprender para fazer certo. Faz parte desta vida sentir alegria com qualquer coisa que nos faça sorrir, pois isso não se controla. Viver pela fé que depois da morte seremos recompensados, é negar a responsabilidade de nossas decisões, é retirar-nos a nós mesmos a administração de um dia a seguir ao outro. É reafirmar o medo de errar. É sucumbir e perder a vontade interna, o norte da sua estada aqui. Viver uma vida mediando-se pela que, supostamente, vem depois, seria o mesmo que estar no quinto ano de escola e prestar exames com temas do sexto. É negar a própria experiência em si, quiça, um estágio.

Usufrua da sua religião, da sua crença, do seu Deus e da sua fé como fonte de inspiração. Como algo que lhe proporcione serenidade, balanço. Que o faça ‘vibrar’ de uma forma positiva, de maneira que as suas decisões reflitam um comportamento afinado com as suas intenções, de maneira que você se aproxime à perfeição do que a sua natureza, nesta vida, como ela é, se encaixa no meio, com o meio. Desencadeie situações de honestidade para com a sua vontade e as consequências farar-se-ão sentir. Ainda antes da morte.

Eu desejo a todos uma boa semana.

Eduardo Divério.

quarta-feira, março 21, 2012

 

Desgaste mau Intencionado


Fui chamado à atenção algumas vezes, por pessoas diferentes, e isso chegou mesmo vir à tona em processo psicoterápico, que tenho uma tendência a desculpar as pessoas, a ilibá-las da consciência da razão de seus atos e logo, de suas consequências.

Isso mexeu com muita coisa e inclusive, foi posto à prova em mim, um alegado receio onde eu pudesse estar a exercitar um mecanismo  de autodefesa, onde eu, ao mostrar-me complacente, para não perder a ‘simpatia’ da pessoa, revelaria na verdade, o mais profundo receio à rejeição.

Era fato que a rejeição era assunto recorrente e por isso, preocupante. Contudo, anos de análise e pesquisa do meu ‘eu’, deixaram-me saber que afinal, não se tratava de um esquema anti rejeição, mas de múltiplos processos pelo fundo.

Hoje, aos quarenta anos, entrando em paz com a minha natural sensibilidade, posso traçar com segurança alguns desenvolvimentos.  Eu nasci curioso, eu cresci precisando saber o que havia por detrás das portas e dentro das caixas, querendo saber como as coisas funcionavam.  Curiosamente, características do meu  signo Gêmeos.  Também não conseguia mentir ou melhor, não conseguia não dizer o que não era verdade. Isso num regime militar e católico, deu um bocado o que falar...

E então lembro-me das centenas de vezes que fora castigado por ter feito algo errado que no entanto,  revelava-se tão surpresa para mim, aquele acidente, do que era o ato para minha mãe, pois eu tinha intencionado fazê-lo bem. As intenções de uma criança, expressas pelo mundo adulto, podem ser comparadas com o desafio a um pintor profissional em  reproduzir a Moraliza, com tinta guash e à chuva.

Tenho esta memória viva em mim, a sensação, a certeza  que se iria fazer ‘bem’ e no fim, acabar tudo ‘mau’.  E daqui desenvolvi esta máxima comigo: Assim como todos são inocentes até que provem o contrário, também acredito que as intenções das pessoas são a verdade, o como tudo poderia ter acabado.

Contudo, toda ação tem sua reação. Todo o ato gera uma consequência e bem intencionada ou não, o resultado de um feito refletir-se-á na vida de muitos, por vezes, por muito tempo. E todos querem justiça, todos querem que o mau em suas vidas seja reparado e nada melhor do que detonar com aquele que o causou.

Mas ainda, pela idade em que me  encontro de novo, também sei que água mole me pedra dura, tanto bate até que fura. Ou seja, há situações, que mesmo reconhecendo as intenções e os limites de um ser, nos levam a exaustão. E aqui, como eu entendo, não se trata de negligenciar as intenções num julgamento, mas falo de desgaste. Como o de uma engrenagem de um relógio que o fará atrasar. O desgaste, o cansaço, expõe-nos à outras lutas, a outros sentimentos e estes acabam por exigir uma atitude mais firme, mas pelo mau que adveio daí, não por deixar de acreditar nas boas intenções.

Eu continuo ‘perdoando aqueles  que me ofendem’, pois acredito que haja uma falha na comunicação entre o ‘servidor’ que gera as intenções e os ‘servidores’ que recebem o sinal. É claro, há casos de pura mesquinhez, mesmo de mau carácter, mas ouso em dizer que suas intenções revelam-se claras e coerentes com seus atos.

Em resumo, a velha história do buscar se conhecer, do buscar se compreender e acima de tudo, compreender o meio, mover o foco para fora de nós também. Afinar a execução de nossos atos com a as nossas intenções. Equilíbrio.

Cabe bem lembrar que o inferno está cheio de gente bem intencionada...

Uma boa semana para todos.

Eduardo Divério.

segunda-feira, março 12, 2012

 

Negação


Negação
nome feminino

1.    ato ou efeito de afirmar que algo não é verdadeiro ou não existe
2.    recusa; rejeição
3.    o que contradiz ou é contrário a algo
4.    incapacidade; inaptidão
5.    falta; carência
6.    mecanismo de defesa descrito por Freud para descrever o processo mental através do qual uma pessoa se recusa a perceber aspectos desagradáveis da realidade interna negando a existência deles


Há níveis e intensidades de negação. Pode ser  um processo tão sério como qaulquer outra disfunção clínica, como a cegueira por exemplo, pois ela limita e condiciona a real percepção do objecto como tal. Faz com que um individuo, literalmente, siga pela vida a viver uma versão dela.

A negação pode surgir quando não queremos aceitar que algo está nos acontecendo. Quando queremos ou desejamos algo que vai contra os nossos valores ou educação. Quando continuamos querendo ou desejando algo que já provou nos fazer mal. Mas acima de tudo, decorre da inaptabilidade, da falta do exercício de enfrentar as situações, de se responsabiizar pelas próprias  acções, do retardamento do abandono dos moldes de comportamento da infância e latência onde sempre havia alguém para prover, a mesma pessoa, quiça, que ainda se possa estar querendo evitar desiludi-la, procrastinando  o encontro com sua natureza adulta.

Mas é facto que ocorre com muita mais frequência do que possamos perceber  e quando em processos rápidos e curtos, funcionam como atalhos,  ajudam-nos a ultrapassar melhor uma saudade, uma vontade ou aquele cafageste, sem que precisemos lembrar ou lamentar, focar ou reviver, alguma memória emocional.

Contudo, apesar de causar alívio e evitar trasntornos, mesmo provendo suporte para uma estrutura psíquica que sugere equilíbrio, acaba por ter o efeito narcótico, ou seja,  modula, altera, melhora, incrementa, distorce, muda a realidade em si, de forma  a ser mais gerível, mais suportável e dito isso, imagino, todos entendem onde quero chegar.

Uma mãe pode perceber que seu filho adolescente não gosta de jogar futebol, tem rigoroso cuidado com o que veste,  um selecto gosto pelas artes e que na privacidade do seu quarto, executa as coreografias completas de Madonna e Lady Gaga, enquanto dubla os seus últimos três CDs, inteiros, e acreditar que ele não é gay. Apenas sensível ou artístico.

Por mais que esta pobre alma esteja evitando a loucura, o inferno ou a cadeia, ela está vivendo uma mentira. Ao se deparar com a derradeira decepção que seu filho não terá a vida que ela aspirava, ela passa a acreditar que é tudo um estilo, apenas diferente,  e que nada mudou.  Mas vá lá... todos também sabem que neste cenário, um dia depois do outro, uma performance a seguir a outra, não lhe dará muita chance para permancer em negação... eheheheh.

Quem sofre de negação, ou melhor, que está vivendo um processo de negação, tem uma estrutura racional com tanta lógica e tão desenvolvida à sua volta, de forma a suportar os porquês, que a tudo consegue justificar. Este individuo acredita tando nestas justificaticas, que emocionalmente coaduna com elas, sentido-se incompreendido, injustiçado, e até irritado quando contrariado ou confrontado.

Como na velha fábula do rei nu. Aquela em que o querido de sangue azul acreditou que lhe tinham feito uma roupa com um tecido tão especial, tão rico, que causava o efeito de ser invensível. Cheio de orgulho (e negação), o rei desfilou por entre seus subditos com a tal roupa invisível... peladinho...

E aqui chegamos num ponto que esperava.

Processos internos são um ‘saco’.  A pessoa tem que ter um insight, sofrer uma epífani, executar uma cartarse ou ter um amigo bocudo de forma a se perceber de seu esquema mental. E há mais regras de ética e de poiliticamente-correcto corroborando para deixar as pessoas imersas no seu ‘Matrix’ do que o contrário.

E aqui eu rediireciono meu texto para aqueles que convivem com indivíduos em negação, pois que, cedo ou tarde, fazendo-se a contabilidade ou só a se prestar a atenção nos indícios, as pessoas apercebem-se que afinal  o ’rei está nu’!!

Nossas relações de amizade ou de romance, são construídas à base de confiança. Conviver com uma pessoa é acreditar naquilo que ela conta, descreve e sente. Uma pessoa em negação, vai conduzir seu amigo, ou parceiro, a acreditar numa versão de um tópico do seu carácter. Vai afirmar que este ou aquele assunto é visto ‘assim’ e sentido ‘assado’ e sobre isso acordos firmar-se-ão.

 Agora, imgine que eventualmente, a pessoa em negação (re)adquiriu condições de eliminar este processo trazendo a verdade à tona. Muito provável que aquele que convivia com ela, sentir-se-á traído, usado ou trapaceado, pois que este fundamentou sua confiança, fez planos para a intersecção de suas vidas, acreditando nos descritos ‘assim’ e ‘assados’.

Pior ainda será se aquele que convivia com ela, já tivesse se apercebido que o ‘rei ía nu’ mas que por amor, compaixão ou simplesmente porque entre dois não existe demogracia, passivamente tenha escolhido saudar a ‘nova roupa’ a criar plolêmica.  O quão mais doloroso é então passar por isso?

Compreender um processo de negação pode atenuar a compreensão de uma crise ou salvar um relacionamento. Mas melhor do que se ter algo que possa precisar de resgate, é tentar reconhcer as ‘pendências’ com coragem e abertura, buscar o discernimento, de forma a se evitar acidentes.

Mas de novo, falar para pessoas que vivem processos de negação é como querer escalar um muro muito, mesmo muito alto... não se chega ao topo ou se passa para o outro lado.

Uma semana para todos.

Eduardo Divério.

sábado, março 10, 2012

 

Arrependimento


Arrependimento 
s. m.
1. Acto de arrepender-se.
2. Contrição.

Arrepender |ê| 
(latim *[ar]repoenitere, de poeniteo, -ere, não estar satisfeito com, estar descontente com, ter pesar de) 
v. pron.
1. Lamentar ou ter pena por alguma coisa feita ou dita ou não feita ou não dita.
2. Mudar de intenção ou de ideia.
3. Desdizer-se.
4. Mudar de aspecto, ameaçando chuva.

Um dos sentimentos mais mediáticos da história da humanidade, com uma relação íntima com religião, aliás, quiça ainda hoje, matém sua popularidade através deste meio.

A religião descreve o arrependimento como a ‘porta’ para uma remissão e uma redenção de seus erros. Contudo, algo só pode ser declarado como um‘erro’ em contrapartida do que se postula como ‘certo’. Assim, um ‘erro’seria um desvio, uma má formação, uma má execução de um plano (regra, idéia, acordo...)  e a percepção desta falha, voltaria a enaltecer o postulado ‘certo’.

Mas acredito que para isso, existe a definição de ‘reconhecimento’.

Então vamos de novo: O ‘arrependimento’ é o  ‘reconhecimento’ de um ‘erro’ mas que demanda uma consciência lamentosa de trasngressão, de negligência, de descaso ou descuido. Em outras palavras, assumir culpa e exigir uma reavalorização do ‘certo’.
Bem, pressupõe-se então, que para tal, o ‘certo’ seja já um dado adquirido, uma referência.

Mas e quando não sabíamos como era o ´certo’ mas, de alguma forma, descobrimos que fizemos ‘errado’;  ‘reconhecer´ seria o suficiente ou ‘arrependender-se’ continua sendo mandatório?

Bem, o código cívil prevê que contra um crime, não podemos alegar ignorância sobre a lei. Mas, aqui cabem os dois ‘réus’:  o ‘reconhecimento’ que já  existia uma lei e o ‘arrependimento’ de tão ter estudado o suficiente... Mas isso é justo? Quero dizer, não no sistema judiciário, mas no sistema orgânico do comportamento humano; é ‘certo’ sentirmos ‘arrependimento’ por um ‘erro’ ao qual desconhecíamos uma referência?

Pior ainda, se torna um ‘erro’,  algo que jurávamos ser ‘certo’, feito com a mais profunda e verdadeira intenção, mas que afinal desfez-se?

Lembro-me que nos anos 80, 90, houve todo um movimento psico-filosófio que tentava romper um pouco com este vetorial-uso mediaval do ‘arrependimento’, que não deveríamos olhar para nossos actos do passado com este sentimento, pois que, o que quer que se tenha feito, era o que se podia, se consguia, se sabia fazer e mais importante do que lamentar o feito, seria tê-lo como um marco e aceitar, trabalhar as suas consequências.

Não sei...  quando eu andava à volta dos meus trinta anos de idade, mais otimista, talvez, costumava dizer: ‘Não me arrependo do que fiz porque aprendo para o que faço’. Hoje, uma década depois, abraçado numa garrafa de vodka e ouvindo Adele,  posso fazer uma lista de coisas que fiz e que arrependo-me à raiz dos meus cabelos!

E aí, falando por mim, evidencia-se  uma tênue mistura de lamentação, de pena pelas consequências de decisões desastrosas, com um sentimento de culpa, de irritação também, por não se ter sido mais esperto, dedicado, atencioso, estudioso, paciençoso, bom ouvinte... enfim.

Bem, idenpendente se você ‘reconhece’, se ‘arrepende’,  lamenta ou ‘está cagando’, acho que  o importante é ouvir este sentimento e perceber que, se voce não fez nada deliberadamente sabendo que iria ferrar com aguém, ou alguma coisa, que o facto de não se saber, não ser mais esperto, mais dedicado, mais atencioso, foi extamente o que faltou para evitar o ‘desastre’. Logo, falta de consciência. Lamente seu descaso, sua leviandade com o assunto, mas aprenda. Cresça daí.

Mas não se martirize em culpa! Não se imponha um ‘arrependimento’. Se fi-lo porque qui-lo, é porque o cenário, a conjuntura e a corrente maturidade assim entenderam. Se disso surgiram perdas e danos, não os olhe como punição ou castigo, mas como um acidente, afinal, dizem, o inferno está cheio de gente bem intencionada.

Acidente

s. m.
1. Casualidade não essencial.
2. Sucesso imprevisto.
3. Indisposição repentina que priva de sentido ou de movimento.
4. Irregularidade do terreno, quebra, ondulação, fragosidade.
5. [Gramática]  Flexão.
6. Cada um dos sinais que servem para alterar as notas.
7. [Teologia]  Figura, cor, sabor e cheiro que fica do pão e do vinho após a sua consagração. (Mais usado no plural.)
[Medicina]  acidente vascular cerebral: perda de funções cerebrais decorrente da interrupção do fluxo sanguíneo no cérebro (ex.: acidente vascular cerebral hemorrágico, acidente vascular cerebral isquémico) [sigla: AVC].

Uma boa semana para todos.

Eduardo Divério.

 

A Síndrome do Pecado Original


Adão andava lá pelo paraíso num tédio de dar dó. Sentía-se sozinho, vivendo uma mesmisse onde nada de novo acontecia. Um dia, depois de um sono muito profundo, acordou com uma cicatriz enorme e uma mulher chamada Eva ao seu lao. Ele, que era um homem que nunca a nada havia buscado ou visto, apaixonou-se por ela no mesmo instante.

Eva seguia sua vidinha, preparando abóbora para o jantar, fazendo cozidos à Portuguesa só com carnes bovinas de primeira, colocando roupa na máquina e extendendo-as de seguida, lavava louça, aspirava a casa, ía à feira, enfim. Lá pelas tantas, num belo dia, faz amizade com uma Serpente que era boa de papo como só ela!

Eva levou a serpente para jantar em casa e esta, contava-lhes histórias incríveis, de lugares fantásticos, com pessoas maravilhosas, com coisas interesssantes para se ver e fazer e, apesar de Adão não mostrar o menor interesse nos contos, Eva deixava sua imaginação viajar por aquelas histórias.

Eva e a Serpente começaram a trocar emails todos os dias e eventualemente começaram a sair para tomar chá. Sua amizade crescia e fortificava-se em companheirismo e confiança. A Serpente levou Eva à Macy’s e a Bloomingdales, fê-la vestir Dior e as jóias da Bulgari. Mostrou-lhe uma  gama de maquiagem da Chanel, vizitaram juntas o London eye, a torre Eifel e o Empire Sates. Assistiram ao Fantasma da Ópera e aos Monólogos da Vagina, liam Sartre e ouviam todo o tipo de música, sempre juntas.

Entretanto, Adão sentia-se enciumado e possessivo, mas em nada melhorava seu comportamento, em nada progredia como pessoa, como se não soubesse usar a dádiva da vida soprada em seus pulmões.  Sua incompatibiidade de espírito com Eva gritava e ela não sentia o amor, o conforto e a companhia que sentia junto da Serpente.

Como se era de esperar, Eva, tomada por sentimentos e sensações de tamanha grandiozidade, reconhecendo a pureza e a naturalidade com que se envolvera  com aquilo tudo, acaba por trair Adão com a Serpente.

Adão diz-lhe coisas horríveis e lembra-lhe que ela tinha uma costela dele. Nos dias que se seguem, Eva começa a sentir-se deprimida e muito culpada, pois antes da Serpente, sua vida era amena e apesar de saber que fizera tudo por vontade própria, começou a responsabilizar a Serpente por ter-lhe apresentado um mundo ao qual ela não conseguia resistir. Não só, sentia culpa por estar apaixonada por outra criatura que não àquela com quem já vivia.

Eva passa a escrever cada vez menos para Serpente e eventualemente, deixam-se de se falar. Não que Eva já não amasse-a mais, ou que em seu íntimo ainda não clamasse por toda a felicidade que sentia ao lado da Serpente, mas porque a sua culpa fazia tudo o que sentiam paracer ser errado, nojento. Olhar, pensar na amiga, no seu verdadeiro amor, era automaticamente associado à causa de dor, de desvio de comportamento, de traição , resignando-se àquela vida.

Eva nunca entendera que apesar de não ter agido da forma mais correta, nunca fôra pelo mal de ninguém, nunca aceitou que fizera como pudera. Nunca entendera que o chamado interno, que a revelação da sua natureza em ser mulher, demandava mais do que ser só esposa. Eva nunca entendeu que era prisioneira de um mundo que não era o dela.
Sentindo-se resposável por não voltar a deixar o bundão do Adão sozinho, ela desenvolveu mecanismos para esquecer e afastar o acontecido dela, num acto inconsciente de auto-punição.

Os anos seguiram, mas nada nunca mais fôra o mesmo. Ambos já sabiam quem eram e o que precisavam como seres humanos, mas ao se calarem, ou ao não se ouvirem, condenaram-se a uma vida de depressão e mesmisse e até o paraído, aos olhos deles, perdeu toda a sua beleza. Seus filhos, por consequência, também nunca conheceram o paraíso em seu explendor, pois este, apesar de igual, fôra-lhes apresentado pelos olhos de seus pais...

Nós crescemos com os valores e sob as regras no nosso meio infantil e via de regra, é a relação que temos com nossos pais que vai dar o nível de intensidade em como experienciamos, desafiamos,  estes valores e regras.

À medida que crescemos, descubrimos que temos uma sensabilidade própria. Por exemplo,  apesar de seu pai querer que sejas médico,  queres ser bailarino, sentes-te muito, mesmo muito feliz quando danças. Mas se a dança, na sua cultura (o meio e os valores da infância), estiver atrelada a ínúmeros predicados negativos, como:  ‘ser coisa de viado’, ‘não pagar as contas’, ‘dá-te uma carreira muito curta’ ou ‘não é um emprego de um homem de  verdade’,  só lhe resta então ou romper com esta cultura ou romper com a dança -  que te dá imensa felicidade…

E basicamente vivemos asim. Nossa natureza, nossa criatividade, nossa cuirosidade,  vai envolvendo-se com coisas adversas aos nossos  “valores” e ao permitirmo-nos ’provar da maçã’, na confusão que isso gera, mergulhados em culpa, acabamos por afastar de nós aquilo que na verdade nos teria trazido felicdade.

Romper com valores é muito difícil. Por outro lado, quando estamos certos de um valor e sentimos que precisamos  agir contra ele, acabamos com a sensação de traição, de termos feito sujeira. Mas muitas vezes,  é no caos que está a libertação e muitas vezes é na separação que encontramos a reconcialização, quiça, com este mesmo valor. Se de forma a podermos ter certeza, com liberdade verdadeira,  que isso ou aquilo é mesmo o que se quer, eventualemente, ir contra um valor nobre terá de ser o preço.  Mas lembre-se que faz parte de nossa natureza e lembre-se também que não somos julgados por nossos erros, mas por como os consertamos, pelo o quê aprendemos com eles.

Acima de tudo, perdoe-se por ter errado. Perdoe-se por ter  ‘traído’ um nobre valor, mas não faça da experiência algo sujo a esquecer e não feche os olhos às motivaçóes que lhe levaram a este acto. E preste muita atenção para não se submeter à auto-punição, para não aplicar a si mesmo  um castigo. Ache balanço, procure equilíbrio e naturalmente encontrar-se-á paz, entrar-se-á  em afinadade na relação entre sensibiildade e valores.

Ainda na analogia fé versos tentação, lembre-se que ninguém se apaixona por outra pessoa enquanto seu coração permanece  ocupado, é preciso estar vazio para que isso ocorra, mesmo que já se viva com alguém.

Lembre-se que sentir o desejo por algo nada mais é do que uma reação natural de atração, de compatibilidade entre voce e o ‘objecto’.

Lembre-se sempre de escutar o que vem de dentro de voce, pois na realização disso, reside o segredo de nossa paz.

Perdoe-se sempre, pois  és de carne e osso e erro nenhum fôra causado por mal. Aprenda com ele!

Por fim, permita-se.  Permita-se ouvir, reavaliar, questionar... permita-se sempre! Cada idade nos revela um um novo nível de compreensão. Logo, querer arrastar os mesmos, intocáveis, valores pelo curso da vida é... pouco natural.

Uma excelente semana para todos.

Eduardo Divério.

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